segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Cadê o trem?

Antigos projetos de ferrovias que ligam Brasília a Luziânia e a Goiânia custam a sair do papel. Agora, a promessa é de que as obras comecem no segundo semestre do ano que vem

Em setembro último, o Partido Socialista do Brasil (PSB) entregou todos os cargos que ocupava no governo federal para seguir rumo próprio na disputa presidencial que se aproxima. Com isso, ministros e assessores socialistas deixaram a Esplanada. Entre eles, estava Marcelo Dourado, ex-chefe da Superintendência do Desenvolvimento do Centro-Oeste (Sudeco), responsável pelos projetos das ferrovias Brasília/Luziânia e Brasília/Anápolis/Goiânia, que preveem transporte de carga e passageiros. Em entrevista a Encontro Brasília, antes de saber que deixaria o posto, ao ser questionado sobre o andamento das obras, Marcelo alertou: “O transporte sobre trilhos é a solução para a mobilidade urbana. E essa tem de ser uma política de Estado, não de governo”.

A falta de planejamento e um intricado jogo político de interesses com certeza influenciam para que os trens, que ajudariam a desafogar o trânsito de Brasília e desenvolver a região, não saiam do papel. Anunciada no fim de 2011 com pompa e circunstância, com a presença dos governadores do DF, Agnelo Queiroz, e de Goiás, Marconi Perillo, a construção da Brasília/Luziânia é considerada fácil. Inaugurado em 1968, o trecho ferroviário já existe e faz, até hoje, transporte de carga. Contudo, desde 1990 o trem não leva e traz passageiros.

A obra é vista como relativamente simples porque a linha férrea já existe. Contudo, quase dois anos após o anúncio feito pelas autoridades, sequer foi divulgada a empresa que fará o Estudo de Viabilidade Técnica Econômica e Ambiental (EVTEA). Dourado se exime da responsabilidade pelo atraso, mesmo tendo permanecido por mais de dois anos no cargo: “Tem muita gente que se diz preocupada com a população, mas é da boca para fora. Estão preocupados, na verdade, é com outra coisa. Vocês não imaginam a pressão que recebi para que as licitações não saíssem. Teve peixe grande que falou para eu cancelar tudo. Mas nunca faria isso”, dispara.

Ele também afirma que, por muito tempo, tentou incluir a ferrovia no PAC da Mobilidade, mas não conseguiu: “Enviei um caminhão de ofícios, solicitando a inclusão da Brasília/Luziânia no programa. Fizemos várias audiências públicas para discutir o tema e sei que 100% da população é a favor. Porém, mesmo com as ruas gritando por um melhor transporte público, ninguém atendeu meu pedido”. 

Divulgado quem fará o estudo, o passo seguinte é anunciar outra licitação para escolher quem vai operar a ferrovia. A previsão é de que as obras comecem em junho do ano que vem e beneficiem 600 mil pessoas. O percurso, que leva até três horas de carro em horário de pico, poderá ser feito em 50 minutos. Quatro vagões, com capacidade para 900 pessoas cada um, farão o trajeto várias vezes ao dia. Os investimentos não devem ultrapassar os R$ 160 milhões. Preço relativamente barato se comparado a outro projeto de mobilidade urbana, o BRT Corredor Eixo Sul, que percorrerá o equivalente à metade do trajeto – 40 km – e custará R$ 530 milhões.

A ideia do Brasília/Anápolis/Goiânia é antiga. Quando construiu Brasília, Juscelino Kubitschek havia previsto um trem para ligar as duas capitais. Também chamado de Expresso Pequi, ele é considerado estratégico para o desenvolvimento da região. Com 6 milhões de habitantes, a previsão é de que, em 15 anos, dobre o número de moradores no raio de 200 km em que estão as cidades contempladas, segundo estimativa do IBGE.

Diferentemente do outro trecho, o estudo de viabilidade deste já está sendo feito, e a previsão é de que as obras também comecem em meados do ano que vem. Orçado em R$ 700 milhões, a promessa é de que o trem chegue a 180 km/h e faça Brasília/Goiânia em 50 minutos. A parada em Anápolis promete alavancar a cidade. Segundo maior polo de fármacos do Brasil, Anápolis também é estratégica porque outra ferrovia está prevista para cortar a região, a Norte/Sul, e isso ajudaria no escoamento de grãos que vêm para o Centro-Oeste.

Anasário José da Silva veio para Brasília em 1970 para trabalhar na manutenção dos trilhos da Brasília/Luziânia. Ele mora, até hoje, à beira da estação Bernardo Sayão, assim como diversos colegas que se mudaram para a capital para trabalhar na ferrovia. “Minha vida e a de muitos que estão aqui são estreitamente ligada à ferrovia e, para nós, é uma tristeza vê-la parada. Ela poderia desempenhar um papel fundamental no desenvolvimento da região”, ressalta.

O engenheiro Antônio Rosa também se queixa do abandono da estação. “Não serve para nada. Só como ponto de encontro de drogados e mendigos”, diz. Ele se lembra da época em que a estação estava ativa: “Era muito melhor. Se voltasse a funcionar, as casas seriam valorizadas.” 

Nenhum comentário:

Postar um comentário